Foto: aposentada Gláucia Macedo (Marivaldo Porto-Divulgação)
Gláucia Macedo*
No final de 2019 e início de 2020 eu ouvia falar do coronavírus em Wuhan na China, mas me parecia uma realidade tão distante que mantive a viagem em família programada para o período do Carnaval, porém, eu sentia uma angústia no peito como prevendo algo ruim que estava por vir.
Quando a pandemia de covid-19 foi declarada oficialmente no dia 11 de março de 2020 e, dois dias depois confirmado o primeiro caso no Estado do Amazonas, a família resolveu que eu e meu marido deveríamos ficar isolados.
Fiz então minha última visita a um supermercado para comprar mantimentos suficientes para uns 3 meses que era o tempo que imaginava que iria ficar confinada. Ledo engano, somente após dois anos e de passar por momentos que eu lembro como um pesadelo medonho, no qual perdi muitos amigos queridos e alguns parentes, ainda sofro com as consequências dessa pandemia.
No primeiro ano, apesar do isolamento social, consegui manter a sanidade física e mental, através de uma alimentação saudável, leituras, cuidados com a casa e a rotina de atividade física que passou a ser on-line. Porém, chegando próximo ao final do ano de 2020, todos já achando que a pandemia estava no fim e relaxando um pouco o uso de máscara, após uma saída para um encontro de amigas, eu contraí o vírus.
Senti nos quatro primeiros dias sintomas de gripe como coriza, febre e dores no corpo. Passados os primeiros dias os sintomas diminuíram permanecendo apenas as dores, principalmente nas articulações.
Sem poder sair para buscar atendimento médico, só obtive o diagnóstico de artrite reumatoide após um mês de muitas dores, que, mesmo utilizando a medicação recomendada pela Reumatologista, ainda perduraram até o meio do ano.
Todavia, a maior dor foi a que passamos no mês de janeiro de 2021. A dor de ver pessoas próximas a nós sofrendo e vindo a falecer por falta de oxigênio, amiga que perdeu o esposo e não pode fazer o velório, outro cujo corpo teve que ficar em carro frigorífico pelo excesso de enterros naquele dia, pessoas em comunidades carentes tendo que fazer vaquinha para ajudar no pagamento de um enterro e muitas outras situações aterradoras que hoje olhando para trás parece um pesadelo.
Hoje, dois anos após o início, ainda não consegui acordar totalmente, vejo a maioria das pessoas como que em um estado de letargia, lutando para acordar, mas retornando logo a seguir pois a cada momento uma nova onda pode aparecer.
Foto: aposentada Gláucia Macedo (Marivaldo Porto-Divulgação)
Estou tentando me adaptar a esse “novo normal”, retomando as atividades assistenciais, para as quais pretendia me dedicar com mais afinco quando me aposentei em 2019, cuidando da minha mãe que nesses dois anos parece que envelheceu dez, sentindo ainda as dores nos pés e nas mãos, mas agradecendo a Deus todos os dias por ter “sobrevivido”.
E vendo nessa sobrevivência um recado divino de que ainda não estou pronta para partir, ainda preciso me melhorar muito, ajudar àqueles mais necessitados do que eu, aprender a ser tolerante com as pessoas que pensam diferente de mim, aceitar que ainda vivemos em um planeta mais próximo da barbárie do que da civilização, onde as pessoas ainda lutam contra a ciência e acham que ganhar dinheiro ainda é mais importante que qualquer outra coisa.
*Glácia Macedo é aposentada, filha, mãe, avó e trabalhadora volutária nas Obras Sociais Pão Nosso,