“Arthur perdeu a capacidade de gerenciar Manaus”, afirma vice-prefeito Rotta

O vice-prefeito de Manaus, Marcos Rotta (DEM), declarou, em entrevista ao blog, que o prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto (PSDB), perdeu o interesse e a capacidade de gerenciar a cidade muito antes de anunciar que havia contraído covid-19 e se licenciar da função no dia 6 de julho.

Rotta afirmou que Arthur Virgílio delega poderes a grupos com interesses diversos ao da população e à primeira-dama Elisabeth Valeiko, a quem chamou de “prefeita sem voto e sem noção administrativa”.

“O Arthur não tem mais paciência para gerir nada, para discutir a cidade de Manaus e delega muitos poderes. Ele perdeu a capacidade de gerenciamento. (…) Acho que não tem mais saúde para gerir a cidade e deixou na mão de pessoas que têm vários interesses, menos a resolução dos problemas da cidade”

Nesta quarta-feira, dia 22, completa 17 dias que o tucano deixou Manaus, epicentro da pandemia, num jato particular, para finalizar o tratamento de covid-19 em São Paulo. Desde lá, só se tem notícias de Arthur Neto a partir das críticas que ele faz à administração do presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido) nas redes sociais.

Em abril, durante uma reunião ministerial, Bolsonaro chamou o tucano de “prefeito de bosta” por ter aberto valas comuns para enterrar mortos de covid. Manaus foi a única cidade do País a adotar este procedimento.

A soma de dias de afastamento de Arthur da rotina normal da administração da cidade, a contar da data de internação no Hospital Adventista, é de 24 dias. Quase um mês sem prefeito. O substituto, o procurado-geral do município Rafael Albuquerque, só aparece nas publicações de Diário Oficial do Município.

O vice-prefeito Marcos Rotta é pré-candidato a prefeito de Manaus pelo DEM e justifica que, se substituísse o prefeito, teria problemas na justiça eleitoral. Rotta diz ainda que Arthur orienta secretários a não atendê-lo.

A reportagem procurou a Semcom (Secretaria municipal de comunicação) questionando se prefeito e primeira-dama gostariam de responder às declarações do vice-prefeito. Nada foi respondido até o fechamento desta matéria.

Leia a entrevista com o vice-prefeito Marcos Rotta a seguir:

“Se temos muito problema para gerenciar no futuro, isso se deve ao pouco tempo que o prefeito utiliza para administrar a cidade”

Rosiene Carvalho (RC): Na sua opinião, o que a administração municipal deveria estar fazendo em Manaus neste ano de pandemia, vice-prefeito?

Marcos Rotta: Primeira coisa: o prefeito tem que estar na cidade e gerenciar a cidade que ele foi eleito. Se nem o prefeito tem confiança no sistema de saúde dele, o que as pessoas vão  esperar? Desgoverno total. Recentemente ele assinou R$ 15 milhões para as mídias sociais da prefeitura. Ao invés de pegar esse recurso e destinar às costureiras, microempresários, ele preferiu dar R$ 15 milhões para gerenciar a imagem do prefeito e da prefeitura. Eu não vi a prefeitura fazendo distribuição de máscaras, eu não vi a prefeitura indo para a rua conscientizar as pessoas. Nenhuma ação social de geração de emprego e renda, de auxílio emergencial. Ele diz que a prefeitura está muito bem, equilibrada. Mas ele esquece de dizer que tem R$ 2,5 bilhões de empréstimos.

Ninguém sabe como está o equilíbrio fiscal da prefeitura. Isso é uma caixa preta. Só ele tem acesso a isso. O homem de confiança dele, que construiu uma política diferenciada na Semef, pediu o boné e saiu da Semef. O Fabian (atual secretário da Seduc), que fazia um trabalho belíssimo, pediu o boné e saiu. O Elano, da Seminf, saiu. Peixoto pediu o boné e saiu. O Homero, Ulisses Tapajó, a mesma coisa. Empaca tudo no prefeito. Tem muita gente que se acomoda no serviço público Mas há muitas pessoas, iguais a mim, que não conseguem. Se temos muito problema para gerenciar no futuro, isso se deve ao pouco tempo que o prefeito utiliza para administrar a cidade. Tem várias bombas relógios: lixão, radar, contrato de dez anos com as empresas do transporte público… Se isso acontecer, é um escândalo.

RC: Por que o senhor optou por não substituir o prefeito, nesta longa licença que tem como justificativa o tratamento de covid-19 e exames em São Paulo?

Marcos Rotta: Se assumisse, eu poderia concorrer a eleição deste ano. Mas, se fosse o caso de uma eventual reeleição, eu estaria impedido. Me acautelei não só pela questão jurídica da eleição, mas também porque, se em três anos e meio o Arthur não me valorizou, acho que não tinha nada que fazer aí. Acho que ele precisa criar mecanismos para um desfecho da administração dele. Que ele responda no futuro pelo desfecho e qualquer outro tipo de coisa que vier a acontecer.

RC: O que aconteceu quando o senhor teve que substituir o prefeito?

Marcos Rotta: Os secretários não me atendiam. Ele se reunia com os secretários antes e dizia: estou saindo mas não quero que nenhum secretário atenda o vice-prefeito. Ele era muito bem claro.

“Se eu fosse substituir o prefeito agora, tenho certeza que com duas hora de gestão ele ia voltar de São Paulo com soro debaixo do braço”

RC: Então, se o senhor substituisse o prefeito agora, teria uma caneta sem tinta?

Marcos Rotta: Se eu fosse substituir o prefeito agora, tenho certeza que com duas hora de gestão ele ia voltar de São Paulo com soro debaixo do braço. Porque eu sei o que ia fazer. Ele sabe que eu sou capaz de fazer.

RC: O senhor disse que os secretários não atendiam…

Marcos Rotta: Havia uma nítida orientação para que eu fosse uma figura decorativa na gestão dele. Isso se deu mais ou menos no Carnaval do ano passado. Ele saiu para fazer turismo pelo mundo e eu fiquei em Manaus.

“Não consigo entender alguém que não colocou a mão na massa e ainda se deu ao luxo de ser contaminado”.

RC: Como avalia a gestão da pandemia por parte da prefeitura?

Marcos Rotta: O Arthur fez umas declarações chamando o governo para uma gestão em conjunto da crise. Depois de dar aquela ideia, o Arthur simplesmente sumiu. Ele deixou toda responsabilidade da covid-19 para o governo. O que sobressaiu, no município, foi por parte da Samel, uma empresa privada. A Samel tomou as rédeas de uma política que, por obrigação, deveria ser do município. Não consigo entender alguém que não colocou a mão na massa e ainda se deu ao luxo de ser contaminado.

Essa questão do Arthur, cá entre nós, está muito estranha né? Ele estava internado no Hospital Adventista, com dois dias para levar alta, ele é transferido para o Hospital Sírio Libanês.

RC: O senhor acha que ele piorou?

Marcos Rotta: Ou tem mais coisa pelo meio, que a gente não sabe. Mas alguma coisa tem. É o que se comenta nos quatro cantos da cidade. Não é normal. O prefeito no olho do furacão, se desgastando politicamente, indo de encontro ao que defendeu: que Manaus estava na vanguarda do tratamento.

RC: Quem substitui o prefeito nesta ausência não funciona administrativa e politicamente da forma que uma cidade como Manaus precisa?

Marcos Rotta: Já estava há mais tempo sem prefeito. Manaus estava sem prefeito muito antes do prefeito viajar. O Arthur parece que está distante da realidade e distante de sua prerrogativa. Faz tempo que ele não enfrenta os problemas da cidade como enfrentou no passado. Todo mundo sente a ausência de prefeito e todo mundo sabe que ele delegou poderes a quem não teve um voto para ser prefeito de Manaus.

“A gente percebe, realmente, que ela (Elisabeth Valeiko) está entranhada no poder público sem qualquer tipo de conhecimento, qualquer tipo noção de administração pública e com uma gana muito grande de querer dizer que ela tem poderes.”

RC: Delegou a quem?

Marcos Rotta: À primeira-dama (Elisabeth Valeiko). Basta perguntar para secretários, subsecretários: quem é que dá ordem na prefeitura, quem que comanda a prefeitura? Ao ponto de colocarem no elefante branco construído na Constantino Nery uma placa com o nome do prefeito, da prefeita e do secretário de obras.

Placa do complexo viário da Constantino Nery, obra da Prefeitura de Manaus, onde consta o nome da primeira-dama, Elisabeth Valeiko, que, segundo o vice-prefeito, é quem manda no executivo municipal.

Agora, eu pergunto, o que ela fez para merecer o nome numa placa nas grandes obras da prefeitura? A gente percebe, realmente, que ela está entranhada no poder público sem qualquer tipo de conhecimento, qualquer tipo noção de administração pública e com uma gana muito grande de querer dizer que ela tem poderes.

Quando percebi esse movimento, fiz questão de me afastar. Eu trabalhei na campanha do Artur e eu ajudei o Arthur a se eleger. Diversos foram os fatores que levaram o Arthur a se eleger. Um deles fui eu. Mas, agora, acima do prefeito e do vice-prefeito existe uma figura oculta, de conhecimento público, que não deveria estar lá nesta posição. Ela não foi votada. Não disputou a eleição, não chegou ali pelas vias democráticas. É uma estranha no ninho.

RC: Seria a Pollake da prefeitura?

Marcos Rotta: Acho que a Pollake é fichinha para ela.

“O Arthur não tem mais paciência para gerir nada, para discutir a cidade de Manaus e delega muitos poderes (…) Ele perdeu a capacidade de gerenciamento”

RC: Antes de viajar para o tratamento, o prefeito anunciou cortes e alterações na administração. O que mais poderia ser feito?

Marcos Rotta: O problema do Arthur é o seguinte: tudo no Arthur  tem um começo, às vezes tem meio, mas nunca tem fim. Tudo fica pela metade na prefeitura. O Arthur não tem mais paciência para gerir nada, para discutir a cidade de Manaus e delega muitos poderes.

Vamos pegar a SMTU, que era EMTU e hoje é IMMU. Quantos superintendentes passaram por lá nos últimos anos? Sete ou oito, mais ou menos e o problema está aí porque a Prefeitura de Manaus tem uma relação com as empresas que eu não tenho, nunca tive e nem quero ter. É uma relação altamente promíscua e não é de hoje. Eu sempre alertei o prefeito em relação a isso.

O prefeito me delegou a missão que era construir o BRT e eu construí a solução para a cidade. Foi feita a apresentação de um consórcio e a carta de intenção do consórcio, mas não avançou. Ele deu preferência para colocar recursos num sistema que está falido ao invés de tentar uma inovação para Manaus. Isso mostra que ele está distante dos problemas e da realidade. E mostra também que ele perdeu a capacidade de gerenciamento.

O lixão está aí e é mais uma prova. Está esgotado faz tempo e não se vê uma política para gerir um novo lixão para a cidade de Manaus. Os radares até hoje não foram resolvidos. O semáforo inteligente até hoje não foi para frente… Eu acho, que o Arthur está quase, ele mesmo, apagando as luzes da administração dele. Não tem mais disposição, acho que não tem mais saúde para gerir a cidade e deixou na mão de pessoas que têm vários interesses, menos a resolução dos problemas da cidade.

Acima do prefeito e do vice-prefeito existe uma figura oculta. Não disputou a eleição, não chegou ali pelas vias democráticas. É uma estranha no ninho.

“Eu acho, que o Arthur está quase, ele mesmo, apagando as luzes da administração dele. Não tem mais disposição, acho que não tem mais saúde para gerir a cidade e deixou na mão de pessoas que têm vários interesses, menos a resolução dos problemas da cidade”

RC: Vice-prefeito, o senhor acha que esse silêncio da CMM (Câmara Municipal de Manaus) é nocivo à cidade? Porque se olhar pelo que é discutido na CMM parece que Manaus não tem problema?

Marcos Rotta: Tenho bom relacionamento com todos os vereadores. Mas as questas do poder Executivo sempre se sobrepõem. Infelizmente isso acontece em todas as casas: Câmara, Assembleia, no Governo Federal. Vez por outra a gente vê uma ovelha desgarrada, mas logo são chamadas para recompor o rebanho.