Decreto de Bolsonaro sobre IPI prejudica a Zona Franca de Manaus

O presidente Jair Bolsonaro fala à imprensa após reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, no ministério.

O Decreto n° 10.523 de 19 de outubro de 2020 que altera alíquota de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) atinge de morte o polo de concentrados da ZFM (Zona Franca de Manaus), tirando as vantagens competitivas que mantém as empresas produtoras de xaropes de bebidas no Amazonas.

O decreto foi publicado nesta segunda-feira, dia 19, e é assinado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes.

A interpretação sobre o efeito do decreto foi confirmada ao blog, ao longo do dia de hoje, pelo coordenador do Cate (Comitê de Assuntos Tributários Estratégicos) da Sefaz (Secretaria de Estado de Fazenda), Nivaldo Mendonça, e pelo deputado federal Marcelo Ramos (PL). As respostas ocorreram após questionamentos sobre termos técnicos do decreto e uma primeira reação por parte da classe política e da mídia nacional de avaliação positiva do decreto para a ZFM.

Sites nacionais chegaram a publicar matérias dizendo que o decreto era positivo para o Amazonas.

De acordo com o coordenador da Cate, Nivaldo Mendonça, o decreto saiu com erro pois deveria fazer referência à uma especificação técnica que diferencia os concentrados – produto fabricado na ZFM – das demais preparações de bebidas.

Veja que diz o artigo 1° do Decreto 10.523 de 19 de outubro de 2020:

Art. 1º  A Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – TIPI, aprovada pelo Decreto nº 8.950, de 29 de dezembro de 2016, passa a vigorar com a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI incidente sobre os produtos classificados no código 2106.90.10 alterada para oito por cento.

“O art. 1o (deveria) fazer referência à 21.06.90.10 EX01 que diferencia o concentrado das demais preparações (21.06.90.10)”, explica o técnico da Sefaz.

Nivaldo Mendonça alerta que uma nova publicação corrigindo o atual decreto se faz necessária sob pena de acabar com a vantagem competitiva da ZFM.

“Acredito que o novo decreto vá ser corrigido e republicado, pois, se assim não for, as preparações (21.06.90.10) subiriam de 0% para 8% e o concentrado cairia de 8% para 4%”, declarou o coordenador da Cate.

O deputado federal Marcelo Ramos afirma que o decreto publicado nesta terça pelo presidente Bolsonaro teve como objetivo resolver o crédito presumido de IPI na venda do concentrado produzido na ZFM – outra batalha histórica do Estado do Amazonas contra a Receita Federal.

Ramos, assim como Nivaldo, afirma que houve um erro.

Marcelo Ramos explica que, pelo texto do decreto, a alteração da alíquota de crédito de 8% para o IPI foi destinada aos produtos classificados no código 21.06.90.10 e também revogada a nota complementar no capítulo 21, que trata da tabela de incidência de IPI.

Nesta formatação técnica, o deputado Marcelo Ramos concorda com o técnico da Sefaz, que os concentrados não estão inclusos na mudança de 4% para 8/% no IPI, o que “não contempla os interesses da ZFM”.

“Acontece que os concentrados de refrigerantes e bebidas açucaradas não alcoólicas não estão no código principal, mas nas exceções: na exceção 1 e na exceção 2. Portanto, o texto apresentado acaba não contemplando os interesses da Zona Franca de Manaus”, declarou.

Veja a tabela com as especificações técnicas que colocam os concentrados de refrigerante com códigos diferenciados em relação às demais preparações de bebidas e que não estão citadas no decreto do presidente, desta terça-feira:

O deputado Marcelo Ramos afirma que manteve contato com a direção da Coca-Cola, na tarde desta terça-feira, dia 20, e que a mesma também entende que houve um equívoco no decreto. Ramos disse ainda que a indústria, instalada na ZFM, entende que seria necessário apenas incluir no benefício previsto pelo presidente à especificação 21.06.90.10 EX 01.

“Eu entendo que precisa alterar o EX02 também”, disse.

Veja a declaração de Ramos, na íntegra, neste link.

O coordenador da Cate acrescenta que o Ministério da Economia já foi informado sobre “o erro” e alerta que, se não for alterado, o polo de concentrados será prejudicado.

“Se o Decreto n° 10.523/20 não for corrigido (o ME já está sabendo do erro), as preparações em geral (21.06.90.10) aumentariam de 0% (atual) para 8% (a partir de 01/02/2021) e os concentrados cairiam de 8% (atual) para 4%, já a partir de 01/12/2020, ficando, desta data em diante, também com 4%, indefinidamente…”, informou Nivaldo por mensagem enviada à reportagem.

Dezembro e Janeiro sem benefício

Um outro detalhe do novo decreto do presidente Bolsonaro é o período que ele passará a entrar em vigor, caso seja corrigido apenas a especificação técnica.

De acordo com Nivaldo Mendonça, no período entre o fim da vigência do último decreto que estabeleceu IPI em 8% até 30 de novembro e o período que o novo decreto passa a valer, fevereiro de 2021, o IPI para o setor voltaria ao patamar de 4%.

“De acordo com a exposição de motivos, o decreto teria por objetivo elevar a alíquota de concentrados para 8%, a partir de 01/02/2021 (quarto mês subsequente à publicação). Como o Decreto anterior (10254/20) estabelece excepcionalmente a alíquota de 8% apenas até 30/11/2020, no período de 01/12/2020 até 31/01/2121, voltaria a alíquota normal de 4% prevista no Decreto 9394/18 (Presidente Michel Temer)”, explicou.

IPI

Quanto mais baixa a alíquota de IPI maior o golpe no polo de concentrados da ZFM. O aumento do imposto mantém as vantagem competitiva da ZFM e mantém a produção dessas empresas em Manaus. A diminuição prejudica o setor de produção de refrigerantes.

Em abril de 2019, o próprio ministro da Economia Paulo Guedes deu essa explicação a jornalistas da GloboNews ao falar sobre a ZFM em um das várias declarações que demonstrou sua antipatia pelo polo instalado em Manaus.

No Governo Michel Temer, a alíquota baixou de 20% para 4%. Ao longo deste período, há um morde e assopra do Governo Federal no setor. O último decreto para o setor, no Governo Bolsonaro foi no início do ano e deu seis meses de alíquota a 8% até 30 de novembro deste ano.

Foi um fôlego que representava que, no período, novas tentativas de manter o polo na ZFM teriam que ser feitas. Caso contrário, a alíquota voltaria a 4% decretados pelo ex-presidente Michel Temer, o que é avaliado pelo setor como cenário sem atração para produzir os concentrados em Manaus.

Bancada

Segundo Marcelo Ramos, o coordenador da bancada do Amazonas, senador Omar Aziz (PSD), elaborou um ofício que deve ser apresentado nesta quarta-feira, dia 21, ao ministro Paulo Guedes.

“Esperamos que, nos próximos dias, um novo decreto seja publicado para garantir o crédito presumido e garantir segurança jurídica para este setor tão importante do Polo Industrial de Manaus”, afirmou o deputado Marcelo Ramos.