
O depoimento da ex-gerente de compras da Susam (Secretaria de Estado de Saúde), Alcineide Figueiredo Pinheiro, colocou o governador Wilson Lima (PSC), o ex-secretário de Estado de Saúde (Susam) Rodrigo Tobias e a Casa Civil do Governo do Amazonas na cena da suspeita de fraude e do superfaturamento na compra de 28 respiradores.
A ex-gerente de compras apresentou à PF (Polícia Federal) elementos novos no caso em depoimento publicado em primeira mão pelo portal de notícias UOL, neste sábado, dia 25 .
No depoimento, Alcineide faz narrativa de forma ordenada, em tom seguro com detalhes hierárquicos das pessoas que diz terem envolvimento na irregularidade e com dados cronologicamente verossímeis, arrastando para o centro das suspeita de irregularidades, além do governador, Rodrigo Tobias e a Casa Civil.
Ela diz ter provas de abordagens para as irregularidades no celular apreendido pela Polícia Civil, na operação do MP-AM (Ministério Público do Estado do Amazonas) e que, no dia seguinte, teve que entregar o material à PF.
Depoimento
Em depoimento prestado à PF (Polícia Federal) no dia 30 de junho, a ex-gerente de compras declarou que um homem de nome “Alencar” é a ligação do governador do Amazonas Wilson Lima (PSC) com o esquema de fraude e superfaturamento na aquisição de 28 respiradores inadequados comprados em uma loja de vinhos durante a pandemia no estado.
A gerente afirmou ainda que as irregularidades foram operadas por “Alencar”, “a pedido” e “de ordem” do governador. O governo, por meio da Secom (Secretaria de Estado de Comunicação), negou as acusações da sua ex-colaboradora.
Alcineide também afirmou à PF que todo o esquema era de conhecimento e tinha consentimento do ex-secretário de Estado de Saúde, Rodrigo Tobias. Disse também que as abordagens de “Alencar” no setor, após a conclusão do negócio com a Vineria Adega, só pararam quando ela se queixou ao ex-secretário executivo da Susam, João Paulo Marques, e o mesmo pediu intervenção de “alguém” na Casa Civil.
Governador
Quando a operação Sangria foi deflagrada e prendeu temporariamente oito pessoas, incluindo Alcineide e a ex-secretária de Estado de Saúde, Simone Papaiz, a decisão do ministro do STJ Francisco Falcão não expunha um depoimento ou prova com maior contundência para demonstrar a ligação do governador com a suspeita de fraude e superfaturamento.
O conteúdo mais forte sobre o governador Wilson Lima, principal alvo da investigação, vinha das afirmações da subprocuradora geral da República, Lindôra Araújo, que sustentou que o governador “comandava e orientava fatos ilícitos’ no Governo do Amazonas e afirmou que havia “fundadas razões” do envolvimento do governador no crime.
Os indícios dessas “fundadas razões” que a decisão do ministro Falcão apresenta eram manifestações da subprocuradora em que ela indicava entrevistas e as publicações nas redes sociais sobre o caso e dizia que governador assumiu a defesa do ato considerado irregular pelos órgãos de controle, quando o assunto foi noticiado pela mídia.
Se, sem uma testemunha como a ex-gerente de compras, a subprocuradora já sustentava tamanha convicção da participação do governador, como fica o convencimento dela a partir deste ponto da investigação?
Outro dado do processo é que o ministro Falcão acompanhou o órgão ministerial. Exemplo disso é que a PF não pediu prisão da ex-secretária Simone Papaiz e a subprocuradora pediu. Ele acatou.
A PF pediu prisão do governador do estado. A subprocuradoria não concordou e o relator acompanhou o MPF. Este, aliás, mais um detalhe importante.
Ao se manifestar negativamente sobre a prisão do governador, a subprocuradora afirmou e o ministro concordou que a mesma não era necessária “ao menos naquele momento”.
Ex-secretário Rodrigo Tobias
Além de apontar “Alencar” como ligação do governador no esquema, Alcineide colocou o ex-secretário Rodrigo Tobias e o ex-secretário executivo João Paulo Marques como parte integrante de um grupo de pessoas associadas para que a fraude e o superfaturamento ocorresse. Na decisão de prisão da Sangria, João Paulo e Alcineide já eram apontados como agentes de execução efetiva de atos ilícitos de organização criminosa pela subprocuradoria geral da República.
A ausência de Rodrigo Tobias entre os mandados cumpridos no dia da operação causou estranhamento, sobretudo quando a ex-secretária Simone Papaiz, que nem nomeada era no período em que o negócio se efetivou, foi presa. Simone substituiu Tobias na Susam a partir do dia 10 de abril, quando o governador Wilson anunciou sua exoneração em meio à pandemia.
A ex-gerente de compras da Susam diz que o operador do esquema foi apresentado a ela pelo próprio secretário. Veja:

Diz ainda que o alertou o então secretário e o secretário executivo de que os respiradores não serviam para salvar vidas de pacientes que agravassem de covid e Tobias determinou a continuidade da compra.
Veja:

Alicineide afirma que seguiu as tratativas de compras com as orientações do operador “Alencar” porque sabia que ele agia com a autorização do secretário.
Veja:

Casa Civil
A Casa Civil, que era comandada pelo vice-governador Carlos Almeida Filho (PTB), naquela ocasião o homem mais forte do governo entre os nomeados, também entra no bolo apresentado pela ex-gerente de compras.
Isso porque, no depoimento à PF, a ex-gerente da Susam afirma que o operador da irregularidade, chamado “Alencar”, que não era alguém da estrutura administrativa da Susam e do governo, só parou de ligar para ela em horários inconvenientes após intervenção de “alguém da Casa Civil”.
Portanto, segundo a gerente de compras, “alguém na Casa Civil” tinha conhecimento da atuação de “Alencar” e ascendência sobre o operador indicado pelo governador para tratar de ações irregulares na Susam.
Veja:

Em depoimento à CPI da Saúde, João Paulo Marques disse não ter amizade com Carlos Almeida e afirmou que todos as funções que assumiu no governo e até antes eram fruto de seu trabalho e indicação de Carlos Almeida.
João Paulo Marques e o vice-governador Carlos Almeida Filho foram procurados pela reportagem, mas não responderam.