
*Matéria atualizada às 14h45
Detentos da UPP (Unidade Prisional do Puraquequara) começaram uma rebelião às 6h da manhã deste sábado, dia 2. A cadeia foi tomada e sete agentes penitenciários viraram reféns dos presos, que exigiam melhores condições na cadeia.
As informações foram confirmadas, por meio de nota, pelo Governo do Amazonas e por vídeos feitos pelos detentos de dentro do presídio.
A rebelião encerrou cerca de 4 horas e meia depois do início, às 6h. Segundo o governo, houve 17 feridos: dez agentes prisionais, cinco presos e dois policiais militares. Ainda segundo a nota enviada pelo governo à mídia, três dos agentes se machucaram ao pular as muralhas do presídio.
O governo informou que policiais se feriram porque levaram pedradas. A nota não dá detalhes sobre a condição dos presos que foram feridos.
O governo apresentou versão que a rebelião ocorreu como “pano de fundo para tentar criar uma distração, cavar o túnel” e fugir durante a rebelião de um presídio cercado de policiais do lado de fora.
Em vários vídeos e áudios de dentro do presídio, os presos afirmaram que queriam melhores condições para todos e tratamento para detentos doentes
“Existe uma necessidade de fuga, eles tentaram por duas vezes fazer túneis de fora para dentro, como eles viram que não tinha condições, porque a rotina lá dentro é muito forte, eles criaram todo esse pano de fundo para tentar criar uma distração e cavar o túnel de dentro pra fora. O túnel está lá, já detectamos, tem escadas, tem tudo, e nós conseguimos impedir que eles conseguissem êxito”, declarou o secretário de Administração Penitenciária, coronel Marcos Vinicius, segundo material divulgado pela Secom.
No release do governo, há informação que reféns estavam com “estoque” (arma produzida pelos detentos) no pescoço. O governo considerou que ação foi um sucesso porque não houve registros de mortes e atribuiu este resultado à atuação do Estado.
Nos vídeos divulgados pelos presos, desde o início da manhã, eles informavam que não queria mortes e sim melhores condições dentro do presídio.
Especialistas em sistema prisional e segurança públicas, consultados pelo blog e que pediram para não serem identificados, avaliam que na atual condição do sistema prisional, em que presos matam quando querem até mesmo sem armas, não é possível se vangloriar de que mortes não ocorreram por causa do governo.
Em janeiro de 2017, quando 56 presos foram esquartejados durante rebelião, após o massacre não foram apresentada reivindicações. Na ocasião, o governo da época, ao confirmar a guerra de facção, indicou que o objetivo era matar os adversários.
Em maio do ano passado, 15 detentos foram mortos no Compaj em frente a familiares, no horário da visita. Um dia depois, outros 40 foram mortos estrangulados e sem armas em outros quatro presídios da cidade. O governo informou, na ocasião, que não houve rebelião e nem depredação das unidades, apenas presos mortos por asfixia.

Rebelião começou às 6h
De acordo com o governo, a rebelião no Puraquequara teve início durante a entrega do café da manhã, “quando internos serraram a grade de duas celas e fizeram os agentes de socialização de reféns”.

“Melhoria na alimentação, nas condições da prisão e troca na Seap”
Vídeos feitos por presos e divulgados em redes sociais, mostram detentos aglomerados em cima do teto da prisão e também nos corredores entre as alas. Num deles, o detento que faz a filmagem diz que os presos não querem que mortes ocorram. Querem melhores condições para ficar na cadeia. Dizem que estão sem luz, sem ventilação, sem alimentação e remédios.
“Olha a condição desumana que a gente vive. Não tem energia, não tem melhoria. A gente está aqui vivendo que nem lixo. No calor, sem vento. Toda cadeia fechada. A gente não quer problema nenhum, não. A gente não vai morrer, não. A única coisa que a gente quer é reivindicar nossos direitos”, diz um dos detentos.
Em seguida, se ouve em coro os presos gritarem: “É melhoria” É melhoria”.
O detento segue o vídeo dizendo que não há “alimentação boa” e remédios.
“Os irmãos doentes passam mal dentro da cadeia e os ‘auxílio’ não vêm auxiliar nós”.
Depois, um outro detento passa a falar e diz que os “auxílios” levam doenças aos detentos e pedem mudanças na Seap (Secretaria de Estado de Administração Pública).
“Os auxílio vem aqui dentro e traz doenças aqui para dentro. Vem da rua. Tem irmão morrendo aqui dentro. Tá todo mundo doente, parceiro. Não tem remédio. Os presos estão revoltados. Esse coronel, esse diretor tem que sair. Essa secretaria tem que sair do sistema prisional de Manaus. Não aguentamos mais tanta opressão. Precisamos das autoridades, dos direitos humanos, que venham olhar por nós”.
Veja vídeos, enviados ao blog, neste link.
Repórter fotográfico afirma que foi detido e que fotos e vídeos foram apagados
O repórter fotográfico Sandro Pereira afirmou que imagens captadas com um drone, equipamento de trabalho dele, foram apagados por policiais militares após ele ser detido. Segundo Sandro, quando levantou o equipamento para fazer fotos e vídeos aéreas do presídio não havia, no local, aeronaves do governo.
Sandro Pereira afirmou que, quando o helicóptero da PM passou a sobrevoar o local, imediatamente desceu o equipamento.
“Eu subi o drone e já tinha feito as imagens. Quando está sobrevoando helicóptero é perigoso. Eu baixei logo. Assim que baixei, fui cercado pelos policiais. Só que não deu para pegar nome de ninguém. Fui detido, fui levado para dentro da unidade prisional com eles. Apreenderam meu equipamento lá dentro, pegaram meu cartão do drone e apagaram as imagens”, relatou o repórter.
Sandro disse que não sofreu ameaça à sua integridade física apenas abuso em relação à sua atividade profissional. Sandro informou que após as imagens serem censuradas, o equipamento foi liberado.
Às 9h desta sexta-feira, dia 2, a assessoria de comunicação da SSP (Secretaria de Segurança Pública) pediu no grupo de WhatsApp em que mantém contato com vários jornalistas e veículos de comunicação locais, que os mesmos não usassem equipamentos que representassem riscos de acidente. A assessoria informou ainda que equipamentos poderiam ser “recolhidos” pela polícia.
“A recomendação do Departamento de Operações Aéreas da SSP é que os equipamentos sejam recolhido. Ressaltamos que as informações oficiais serão concedidas pela Secretaria de Administração Penitenciária (Seap)”.
Governo Wilson Lima enfrenta explosão de crises
O sistema prisional apresenta problema em meio ao colapso do sistema de saúde e a uma crise política enfrentada pelo Governo do Amazonas, em meio à pandemia que também deve trazer seus efeitos à economia do estado.
O governador Wilson Lima (PSC) e o vice-governador Carlos Almeida Filho (PTB) viraram alvo, esta semana, de um pedido de impeachment na ALE-AM (Assembleia Legislativa do Estado). O pedido questiona a capacidade da administração diante da pandemia de covid-19 e denúncias de desvios na gestão deles.
Outros questionamentos sobre a gestão da pandemia tramitam na justiça do Amazonas e na federal feitas pelo Ministério Público do Estado, Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho e Ministério Público de Contas.
Nas últimas semana, Manaus virou pauta de veículos nacionais e internacionais em função do caos provocado pela pandemia no sistema de saúde e funerário, que é responsabilidade da administração da Prefeitura de Manaus. A última vez que isso ocorreu foi em 2017, quando o sistema prisional produziu cenas chocantes de tortura e corpos esquartejados.
O governo, que chegou ao poder a um ano e meio com votação histórica, tem como governador um ex-apresentador de programa policial de TV, Wilson Lima e o defensor público Carlos Almeida Filho, que não tinham experiência de gestão pública, mas foram impulsionados pela onda do novo em 2018. Wilson Lima derrotou, sem apoio partidário no primeiro turno, força de nomes tradicionais da política do Estado que há mais de 40 anos se revezavam no poder.
Parte destes nomes viraram, em pouco mais de um ano, aliados de Wilson Lima e Carlos Almeida.
Fotos: Divulgação, redes sociais