“Não dá para ficar assistindo o que estamos assistindo no País”, declara Eduardo Braga

O líder do MDB no Senado, o senador Eduardo Braga, declarou que é grave o clima e a imagem que o Brasil tem criado neste momento para um País que precisa atrair investimentos e criar credibilidade.

Para Eduardo Braga, o País precisa voltar à “serenidade e equilíbrio’ e cuidar do que os brasileiros precisam: geração de emprego, educação saúde e segurança pública. O MDB é a maior bancada do Senado.

“É grave o que está acontecendo, é grave o clima que se estabelece no País. E vou dizer: nunca pensei que fosse tão importante começar o Carnaval. Para ver se a folia traz algum bom senso para aqueles que estão governando o Brasil”, declarou o senador.

Em outro trecho da entrevista, analisando os conflitos institucionais e as análises que lideranças políticas e de outros poderes fizeram e foram publicadas em jornais nacionais, na semana passada, sobre a instabilidade do atual governo, Eduardo Braga declara:

“Não dá para ficar assistindo o que estamos assistindo no País. É uma estado de conflito e confronto permanente. Isso não está fazendo bem ao Brasil”, disse.

A entrevista ao blog foi concedida, na sexta-feira, dia 21. Na semana em que as manchetes dos jornais foram tomadas pelas críticas à intolerância e aos ataques do presidente Jair Bolsonaro à imprensa. O episódio mais recente foi a forma misógina com que o presidente se referiu à jornalista da Folha de SP, Patrícia Campos Melo.

Nessa mesma semana, os filhos do presidente Bolsonaro e ele próprio trocaram acusações, pelas redes sociais, com a família do ex-candidato à presidência Ciro Gomes (PDT) após o senador da República Cid Gomes (PDT) enfrentar com um trator policiais em greve e ser baleado com um tiro no peito durante o conflito em Sobral, no Ceará.

A semana também foi marcada pelo “grampo” do chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general Augusto Heleno, numa live das redes sociais do presidente Jair Bolsonaro. O general afirmou que os parlamentares “chantageiam” o Planalto.

“Nós não podemos aceitar esses caras chantagearem a gente o tempo todo. F***-se”,  afirmou o ministro ao se referir ao Congresso Nacional.

Estes conflitos vieram no lastro de uma crise na relação política de Bolsonaro com governadores que, em carta aberta, pediram que o presidente respeite o pacto federativo determinado pela Constituição Federal.

IPI Concentrados

Na entrevista ao blog, Braga afirmou que a bancada do Amazonas precisa de inteligência, diálogo, equilíbrio, busca de aliados e saber usar as “armas quem têm” para evitar o “desastre” criado pelo decreto presidencial sobre o benefício fiscal que mantém no Amazonas o polo de concentrados.

O Decreto nº 10.2545 de 2020, publicado dia 20 deste mês, deu seis meses de IPI a 8%, de junho a novembro deste ano, o que é considerado um dano ao polo de produção de bebidas da ZFM (Zona Franca de Manaus).

Este setor gera cerca de 7 mil empregos diretos e indiretos. Atualmente, o IPI está em 4% desde janeiro. E, quanto menor o IPI, pior para a ZFM que não oferece atrativo diante das outras regiões do País e fora do Brasil.

MDB

O MDB, partido que Eduardo Braga lidera no Senado, tem a 6ª maior bancada na Câmara dos Deputados com 33 parlamentares. À frente do partido de Braga estão: PT (53), PSL (53). PP (41), PL (40) e PSD (37). No Senado, o MDB é a maior bancada com 13 senadores, seguido por PSD (10), PSDB (8). PT, PP e DEM tem seis senadores, cada.

O senador Eduardo Braga foi reeleito em 2018. Tem, portanto, mais seis anos de mandato pela frente. Já foi prefeito de Manaus e governador do Amazonas por dois mandatos seguidos. A reeleição de 2018 foi ameaçada pela onda do novo que levou ao poder o presidente Bolsonaro, o governador Wilson Lima e representou uma renovação de rostos no legislativo.

Antes, Braga sofreu derrotas nas urnas ao tentar a voltar ao comando do Governo do Amazonas, na Eleição de 2014 e na Eleição Suplementar de 2017.

Este ano, Eduardo Braga passou a adotar tom diferente outros membros da bancada do Amazonas em relação ao Governo Federal. O discurso de Braga, neste momento, é de mais confronto que do demais representantes do Amazonas no Congresso Nacional.

Leia a entrevista, na íntegra:

Rosiene Carvalho (RC): Na sua opinião, ainda há alguma possibilidade de se alterar este cenário do polo de concentrados?

Eduardo Braga: Bem. O que nós estávamos conversando com o ministro Paulo Guedes, como o Ministério da Economia e com o próprio Governo Federal não era o que foi publicado. O que foi publicado nos repõe os 8%, mas apenas entre o dia 1º de junho e 30 de novembro de 2020. Ou, seja deixando mais uma vez a ZFM, os trabalhadores, o polo de concentrados e o Estado do Amazonas em posição de desespero. Porque, se no dia 30 de novembro, o governo mais uma vez retornar para os 4% a Coca-cola, a Ambev, a Dolly e outros estão aqui no Amazonas –  são 27 empresas que geram aproximadamente 7.500 empregos diretos e indiretos – perderão a confiança de continuar investindo no estado. O que o Governo Federal havia dito é que retornaria aos 8% e encaminharia um projeto de lei para o Congresso Nacional anulando outros incentivos fiscais para poder manter os 8% permanentes no Polo de Concentrados, aumentando a contrapartida das empresas.  

“O que está acontecendo nos coloca numa posição de confronto com o governo”

RC: Aumentando como?

Eduardo Braga: As empresas iriam produzir mais sucos regionais, gerando mais emprego no interior e na capital. Para manter o nível de IPI em 8%, o que seria bom para todos nós. Seria bom para a indústria, para o trabalhador, para o Amazonas e seria bom para o Brasil. Mas, lamentavelmente, não foi o que o governo decretou. Já pedi que o Ministério da Economia fizesse, por favor, uma análise do que aconteceu. Porque o que está acontecendo nos coloca numa posição de confronto com o governo. Não há como nós da ZFM, nós representantes do povo do Amazonas ficarmos de braços cruzados diante de uma situação que apenas aumenta nossa agonia. E veja: no ano passado, o próprio presidente Bolsonaro já tinha editado um decreto que valeu durante seis meses retornando a alíquota em 10%. Àquela altura, o próprio presidente Bolsonaro disse a mim, e o atual superintendente da ZFM estava presente na conversa, que estava batido o martelo, que seria 10%. Quando chegou final do ano, não prorrogaram o decreto e caiu para 4%. Agora, ele vem, depois de manter em seis meses 4%, aumenta para 8% de junho a novembro. Qual a empresa que vai continuar investindo numa situação como essa?

RC: O senhor acha que a insegurança jurídica se consolida com este decreto?

Eduardo Braga: A insegurança jurídica, a inconfiabilidade do modelo porque um modelo que não se sabe qual a taxa de benefício fiscal porque uma hora é 10%, outra hora é 4%, outra é 8%. Qual empresário que vai investir aqui no polo de concentrados? Isso não é brincadeira. O governo não pode ficar brincando de editar decreto com relação ao polo de concentrados. E o governo tem todas as informações sobre o tema. Portanto, eu tenho que manter o equilíbrio, nós temos que manter o diálogo, porque na democracia é assim que funciona. Não podemos achar que vamos resolver as coisas na bala, no confronto e conflito como acabamos de assistir no interior do Ceará. Não podemos ver o Brasil caminhando para isso.

RC: O momento é preocupante?

Eduardo Braga: Os brasileiros não querem isso. Os brasileiros querem emprego, renda, paz, condições de poder trabalhar, educar os filhos, viver com segurança no País. Portanto, precisamos parar e ter equilíbrio para poder comandar o destino do Estado do Amazonas, do Brasil, enfim de 110 milhões de seres humanos. Somos nós que compomos este País. Portanto, é grave o que está acontecendo, é grave o clima que se estabelece no País. E vou dizer, nunca pensei que fosse tão importante começar o Carnaval. Para ver se a folia traz algum bom senso para aqueles que estão governando o Brasil.

“Não dá para ficar de braços cruzados vendo o governo brincar com o destino de 40 mil amazonenses”

RC: O senador Omar Aziz declarou que nada do interesse do Governo Federal anda na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado, enquanto este decreto estiver em vigor. A bancada do Amazonas tende a uma radicalização na relação com o Planalto, neste momento, na sua opinião? Ainda é possível reverter este decreto?

Eduardo Braga: Eu acho que é. O decreto depende da assinatura de dois seres humanos: do Jair Bolsonaro e do Paulo Guedes. Volto a dizer: não há racionalidade e nem lógica neste decreto. Nós não podemos estar brincando com a alíquota do IPI e com a vida de quase 7.500 famílias aqui no Amazonas. Se multiplicarmos por cinco, estamos falando de 40 mil pessoas, que dependem do polo de concentrados para o sustento. Acho que é possível. Nós temos que lutar firmemente com isso, com equilíbrio, obviamente, sabendo que temos que saber negociar. Mas não dá para ficar de braços cruzados vendo o governo brincar com o destino de 40 mil amazonenses.

“Estamos num zig zag, num puxa e encolhe, o empresário não sabe mais qual é a taxa de incentivo fiscal do polo de concentrados. Não vai mais investir no Amazonas, se não mudar a política imediatamente. Ou o Governo Federal recua ou teremos que fazer um enfrentamento”

RC: O que é possível fazer, como líder no Senado de um dos principais partidos do Congresso?

Eduardo Braga: Veja, é possível fazer muitas coisas. O que não podemos fazer é desistir de lutar. Temos que lutar com todas as armas que tivermos para defender os trabalhadores, o modelo, defender o Amazonas. Entendo que na política há o diálogo e a construção. A arte da política é o diálogo. Somos apenas 11 parlamentares do Amazonas no Congresso Nacional . Então, sabemos que precisamos de aliados nesta briga. Não podemos achar que sozinhos venceremos a montanha. Não é assim. Mas eu tenho muita esperança que com argumentos, com  lógica, com bom senso nós consigamos fazer com que o governo reveja sua decisão. A decisão efetivamente é desastrosa. Porque estamos num zig zag, num puxa e encolhe, o empresário não sabe mais qual é a taxa de incentivo fiscal do polo de concentrados. Não vai mais investir no Amazonas, se não mudar a política imediatamente. Ou o Governo Federal recua ou teremos que fazer um enfrentamento.

“Li o que vários ministros do Supremo manifestaram e estou completamente de acordo. O Brasil precisa voltar à ordem e à serenidade”

RC: O senhor citou a condição do País. Na semana passada, a Folha de São Paulo, o Estado de São Paulo e sites nacionais que tratam sobre política destacaram conteúdo sobre uma situação de instabilidade, chegam a falar de troca de comando de poder por outros setores. FHC deu entrevista e diz que não vê cenário para isso. José Dirceu, num artigo, disse ver todas as condições para um golpe, um retorno da Ditadura Militar. Qual sua opinião sobre tudo isso?

Eduardo Braga: Eu acho que o clima está muito ruim. Precisamos compreender que, num mundo moderno, um País que tem necessidade de investimento, como o Brasil tem de atração de confiança e credibilidade, precisa ter mais serenidade e postura ao longo de seus posicionamentos . Não dá para ficar assistindo o que estamos assistindo no País. É uma estado de conflito e confronto permanente. Isso não está fazendo bem ao Brasil. Os próprios indicadores econômicos estão mostrando isso. O Brasil precisa colocar novamente as coisas nos devidos lugares. O que assistimos recentemente nada mais é que o retrato do Apocalipse. Um senador da República pegar um trator e partir para cima de uma multidão é algo inusitado. De outro lado, policiais num movimento de greve transformar isso em motim e atirar contra um senador da República é algo desastroso. Você imagina quem está assistindo isso de fora o que está imaginando sobre como estão as coisas no nosso País. Eu li as matérias, li o que vários ministros do Supremo manifestaram e estou completamente de acordo. O Brasil precisa voltar à ordem e à serenidade. É preciso dar serenidade ao Brasil para que possamos avançar sobre o que realmente importa. E o que realmente importa é a gente voltar a crescer, gerar emprego, renda, diminuir as desigualdades econômicas, sociais e regionais. Melhorar a política de segurança pública, de saúde, de educação e infraestrutura. É isso que importa para o Brasil.

RC: O senhor quer acrescentar alguma coisa?

Eduardo Braga: Quero apenas dizer que nós amazonenses lutamos há 50 anos pela ZFM e não podemos desistir diante de um decreto. Este não é o primeiro e nem será o último decreto que ameaça a ZFM. E nós teremos que persistir, lutando com inteligência, diálogo, propostas e lógica em defesa do trabalhador amazonense e do povo do Amazonas.

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