
José Alcimar de Oliveira *
Prefiro o conceito de alegria ao de felicidade, mais ainda quando o ideal de felicidade hoje tornou-se compulsório e refém do consumismo.
A felicidade então torna-se repressiva e depressiva. Repressiva porque obriga a consumir. É uma forma de tirania. Depressiva porque é impossível satisfazer sonho de consumo. É uma forma de patologia.
Quem é tragado por essa lógica se despersonaliza e perde a posse de si mesmo. Noutras palavras: o consumidor mais do que consumir é consumido pelo consumo.
O objeto do sonho de consumo nunca satisfeito é reiteradamente renovado em peças publicitárias. É a felicidade como vontade de posse. Italo Calvino, um dos meus santos de crítica e profana devoção, em sua bela parábola filosófica ‘As cidades invisíveis’ apontava que a riqueza e a posse dos habitantes da cidade de Leônia eram medidas pela quantidade de coisas descartadas sob forma de lixo.
Felicidade saudável, penso, é a que poder-se-ia associar à alegria, e portanto refratária à falsidade de uma vida sem frustração; é a alegria de que nos dão testemunho – para citar apenas três grandes pensadores – Epicuro, Espinosa e Nietzsche.
Pensadores incompreendidos, que permanecem sempre atuais, porque souberam fazer da vida a experiência dos afetos alegres e verdadeiros.
Souberam romper a couraça de hipocrisia de quem vive contente no autoengano e abdica do desafio ontológico de tornar-se o que é.
Em Manaus, AM, 19 de janeiro de 2020.
* José Alcimar de Oliveira * é professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Amazonas, franciscano ex-cordis e filho dos rios Solimões e Jaguaribe.
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