O golpe continuado

Foto: Reprodução da reunião ministerial do presidente Bolsonaro do dia 22 de abril

*Por José Alcimar

Diferentemente do Golpe de 1964, empresarial-militar, com tanques na rua, o golpe em curso, com um primeiro desfecho em 2016, segue outra linha, haja vista a via eleitoral da ascensão ao poder de um presidente que se utiliza da democracia, da frágil democracia brasileira, para destruí-la a partir de dentro.

Em recente artigo na Folha de S. Paulo, o Deputado Federal Marcelo Freixo assiná-la que “pela primeira vez temos no poder um governo eleito de extrema direita, com uma base social relevante e um projeto de poder fascista”.

Movida apenas por uma agenda eleitoral, que não consegue sequer articular um projeto de governo, a esquerda segue imobilizada e pulverizada, incapaz de formular uma unidade mínima de ação para fazer frente ao projeto de destruição nacional, presidido pela geopolítica do entreguismo e sob a rédea curta e acelerada do rentismo.

A reunião ministerial do dia 22 de abril de 2020, 520 anos depois da chegada “desinteressada” e “involuntária” de Cabral ao paraiso das commodities, indica nossa trajetória, de gênese e de destino.

O pau-brasil (ibirapitanga para os tupis e caesalpínia echinata na classificação oficial) é o marco do continuado processo de predação capitalista sobre a terra e o homem desse Protetorado sob nome de República. Sempre sob esforço de ocultação, como que por caminhos não dialéticos a malversar a sentença heraclítica de que a harmonia invisível é sempre mais forte que a visivel, o que verdadeiramente estabelece liames entre 1964 e o que é ativado a partir de 2016 é a força regressiva do capital.

Desde 1500, oculto ou não, é o devir dessa força regressiva que nos comanda. É necessário manter o barco à deriva para intensificar o saque.

Sob as mutações que vão da ordem e progresso à segurança e desenvolvimento, permanece o conteúdo adorniano de que sob a lógica do capital se não existe um caminho progressivo que vai da barbárie à civilização, há seguramente um direto que conduz do estilíngue às armas atômicas.

Tudo está a indicar, no Brasil, o longo futuro dessa geopolítica biocida.

*José Alcimar de Oliveira é professor do Departamento de Filosofia da Universidade Federal do Amazonas, teólogo sem cátedra e filho dos rios Solimões e Jaguaribe. Em Manaus, AM, no dia 17 de maio do ano coronavirano de 2020.