
O desembargador José Hamilton Saraiva dos Santos afirmou que “fatos concretos evidenciam” participação do enteado do prefeito de Manaus, Arthur Neto (PSDB), Alejandro Valeiko, 29, no assassinato do engenheiro Flávio Rodrigues, 42.
A afirmação consta na decisão revogou a prisão domiciliar de Alejandro Valeiko, e restaurou a prisão temporária de 30 dias.
“Constato que o decreto prisional possui fundamentação idônea, com fatos concretos que evidenciam, tanto a participação do paciente (Alejandro Valeiko) no crime investigado, quanto a imprescindibilidade do cerceamento da liberdade do, ora, paciente, para o êxito das investigações, em especial, dado que existem elementos que a custódia do acusado é essencial para o correto deslinde da investigação crimina”, afirma o desembargador em trecho da decisão.
A prisão domiciliar foi concedida pela desembargadora plantonista Joana Meireles, no sábado, dia 5, e a temporária pela juíza do 2º Tribunal do Juri, Ana Paula Braga.
Flávio foi encontrado morto num terreno no bairro Tarumã, com marca de seis facadas na costas, perna e barriga, horas após se reunir no domingo, dia 29, com outros homens na casa de Alejandro Valeiko, enteado do prefeito de Manaus, Arthur Neto (PSDB). A casa de Alejandro foi o último local que Flávio foi visto vivo antes do homicídio.
O desembargador relata, ainda, seu convencimento de que a casa do enteado de Arthur Neto foi o cenário do crime:
“Os indícios de autoria estão consubstanciados nas peças inquisitoriais, que indicam que a casa do Investigado (Alejandro Valeiko) foi cenário do crime em apuração, além do fato de que, como bem delineado no decreto de prisão temporária, existem incongruências nos testemunhos dos Investigados (demais presos na quinta-feira)”, afirma o magistrado.
Na decisão, o desembargador José Hamilton Saraiva dos Santo constrói uma narrativa sobre o crime, com base no que foi disponibilizado pela investigação e pela defesa, contrária à primeira versão apresentada para o caso pelo prefeito de Manaus, Arthur Neto, em suas redes socais.
A decisão também acusa contradições nos depoimentos das pessoas que estiveram na casa de Alejandro no dia em que Flávio foi assassinado.
Conduta pós-crime e consequências
O desembargador afirma que Alejandro Valeiko tentou, no depoimento, “dificultar a apuração da verdade” e que a conduta dele enfraquece a alegação da defesa de “ausência de indício de autoria”.
Os advogados de Alejandro apresentaram essa alegação para sustentar ilegalidade na prisão temporária do cliente.
“O Paciente (Alejandro), em seu depoimento, afirmou que não se recordava do nome da Vítima (Flávio) ou dos demais Investigados, dado que os havia conhecido momentos antes da festa que estavam (…) Contudo, consoante o relato dos vigilantes do condomínio em que o Paciente residia, a Vítima era convidado frequente da casa do Investigado, Alejandro Molina Valeiko, o que demonstra o intuito do Paciente, de dificultar a apuração da verdade, enfraquecendo, pois, a ilação de ausência de indícios de Autoria, ao contrário do defendido pelos Impetrantes”.
Na sequência da decisão, José Hamilton Saraiva dos Santos destaca que Alejandro “se evadiu (fugiu) do distrito de culpa” sem informar a polícia. A conduta, para o magistrado, serviu para convencimento de que a prisão do enteado do prefeito é indispensável.
O desembargador registra que a limpeza da cena do crime também dificultou as investigações.
Hamilton Saraiva também destaca que os tribunais superiores de justiça consideram que o não cumprimento de prisão temporária por entraves criados pelo investigado são motivos para a manutenção da prisão.
Prisão domiciliar não tem previsão legal, no caso
O desembargador afirma, ainda, indicando doutrinadores e a legislação que não há previsão legal para substituição de prisão temporária por domiciliar, como concedeu a desembargadora Joana Meireles no sábado, dia 5, atendendo a um pedido dos advogados de Alejandro Valeiko, Yuri Dantas e Marco Aurélio Choy.
O magistrado acrescenta que trocar uma pela outra frustra os objetivos da investigação que requisitou a prisão temporária do investigado.
“Sendo a prisão imprescindível para bom andamento das investigações, tal finalidade somente pode ser alcançada com a segregação cautelar do indivíduo, sob a custódia do Estado, já que a prisão domiciliar, por sua natureza menos restritiva, facilmente ensejaria a frustração desse objetivo (…) Portanto, em sede cognição sumária, ante a inexistência de expressa previsão legal a embasar o pleito dos Impetrantes, não se faz possível a substituição da prisão temporária por prisão domiciliar”, afirma outro trecho da sentença.
Alejandro não preenche requisitos para prisão domiciliar
O desembargador afirma na decisão que não basta que o investigado esteja, extremamente debilitado por motivo de doença grave para ser atendido com prisão domiciliar.
“Há necessidade de se demonstrar, ademais, o tratamento médico do qual o acusado necessita não pode ser ministrado de maneira adequada no estabelecimento prisional”.
O desembargador diz, ainda, que a defesa de Alejandro não demonstrou “quaisquer elementos” capazes de comprovar quadro que o favorecesse com a domiciliar.
Na decisão, Hamilton Saraiva determina, ainda, que Alejandro, na prisão, seja mantido “separado dos demais detentos” como forma de garantir a integridade física e moral dele.
Outros presos
A polícia pediu prisão temporária de Vittorio Del Gato (cuidador de Alejandro), Elizeu da Paz Souza (policial lotado na Casa Militar), Mayc Vinícius Teixeira Parede (amigo do policial), José Evandro Martins de Souza Júnior e Elielton Magno de Menezes Gomes Júnior. Os dois últimos estavam na casa de Alejandro, no dia do homicídio.
Elizeu da Paz foi considerado pelo delegado do 19º Dip (Distrito Integrado de Polícia), Aldeney Goes Alves, que iniciou as investigações e fez os pedidos de prisão, como suspeito de “autoria ou participação” no homicídio do engenheiro Flávio Rodrigues e que pode ter usado veículo do executivo municipal no crime.
Elizeu é policial militar lotado na Casa Militar da Prefeitura de Manaus. A defesa de Elizeu nega a acusação.
A prefeitura até agora não se manifestou sobre as informações.
A reportagem tentou ouvir os advogados de Alejandro, Yuri Dantas e Marco Aurélio Choy, mas as chamadas não foram atendidas.
Foto: SSP – Divulgação