
Nas últimas eleições presidenciais que participou, a ex-senadora Marina Silva (Rede) costumava repetir que, numa disputa eleitoral, o candidato tem três resultados possíveis: ganhar, perder perdendo ou perder ganhando. A diferença é o tipo de projeção que ele conquista na campanha para além dos votos da maioria.
O deputado estadual e candidato a prefeito de Manaus Ricardo Nicolau (PSD) iniciou a disputa deste ano compondo a coligação com maior número de partidos grandes o que, consequentemente, deu a ele o maior tempo de TV e rádio.
Alfredo faz a campanha mais milionária das Eleições 2020, mas Nicolau é que dá a maior impressão de volume de rua e impacto no eleitor. Até pela associação à publicidade em TV e outdoor do hospital particular da família dele com o mesmo mote/trunfo do candidato: o hospital de campanha da Prefeitura de Manaus.
A estratégia deixou os demais adversários rendidos. Isso porque ninguém mais, além de Nicolau, se beneficia da propaganda em outdoor por ser proibido pela legislação eleitoral.
Pesquisas eleitorais recentes mostram o que os aliados de Nicolau avaliam como resultado desta estratégia de marketing cruzado e personificação particular de um serviço público no ano pandêmico: avanço do nome do deputado estadual nas últimas sondagens de voto.
Nem foi tanto. A eventual vantagem de Nicolau não tira Amazonino Mendes (Podemos) do posto de primeiro colocado, tampouco o garante no segundo turno. Mas, sem dúvida, deu fôlego, excelente visibilidade ao nome dele e incomodou. Tanto que o candidato passou a virar alvo da artilharia virtual apócrifa. Até malfeitor do Pica-pau ele virou.
Só que a campanha de Nicolau, que contratou quatro escritórios jurídicos – incluindo o de um ex-membro do TRE-AM, Júnior Fernandes -, não contava com os problemas que a equipe jurídica do candidato de Arthur Virgílio Neto (PSDB) criaria a ele no final da campanha.
A equipe de Alfredo é liderada pelo advogado Paulo Lindoso, ex-sócio do escritório do advogado Yuri Dantas, que atua na campanha de Amazonino Mendes (Podemos).
Revés no TRE-AM: propaganda falsa
Nesta terça-feira, dia 3, o TRE-AM decidiu por unanimidade, em mandado de segurança, que o conteúdo que Ricardo Nicolau na propaganda é falso ao omitir que o trabalho no hospital de campanha é resultado também da atuação do poder público municipal.
A defesa de Nicolau chegou a alegar que Amazonino Mendes usa na propaganda que fez a UEA , David Almeida (Avante) que pagou Fundeb aos professores e ele esta sendo censurado pelo feito no hospital de campanha.
Os desembargadores apresentaram uma alternativa para que Nicolau continue a usar o hospital de campanha na sua propaganda: que fale a verdade. Ou seja, que o trabalho dele no hospital de campanha se valeu da conjugação do esforço público, com bens e serviços públicos municipais.
Para os desembargadores eleitorais, o candidato induz o eleitor em erro fazendo crer que ele foi o único responsável pelo hospital. É como se usurpasse, para si e para a imagem do hospital particular de sua família, um investimento que contou com recursos financeiros e humanos do poder público municipal.
Outro fator que era considerado trunfo na campanha de Nicolau – contar na defesa com um ex-desembargador eleitoral – foi abatido durante o julgamento desta terça. Ao rejeitar a tese da defesa sobre uma das questões preliminares do julgamento, o desembargador relator Márcio Cavalcante citou um voto do advogado Júnior Fernandes, enquanto membro do TRE-AM, e usou contra Nicolau.
Além de conseguir na justiça mudança de rumos no discurso principal da campanha de Nicolau, o jurídico de Alfredo Nascimento impetrou e já conseguiu êxito em pedidos de direito de resposta.
Desde terça-feira à noite, dia 3, a candidata a vice na chapa de Alfredo, Conceição Sampaio (PSDB), aparece no horário que seria da propaganda de Nicolau para dizer que o candidato do PSD faltou com a verdade e tentou enganar o eleitor.
Pedidos de direitos de resposta somam mais de 20 horas
No total, Nicolau já perdeu 96 minutos da propaganda em direito de resposta para o jurídico de Alfredo. Como estes, há pelo menos mais 15 processos a serem analisados. Cada um deles, com 50 minutos de direito de resposta contra Nicolau, relativos a 2.468 inserções, que representam 1.234 minutos. Ou seja, mais de 20 horas de direitos de resposta.
Uma rajada.
Com a decisão do pleno no mandado de segurança, de que a propaganda é falsa, a expectativa é que os pedidos de direito de resposta pendentes de julgamento sigam o mesmo curso.
O resultado da combinação de erros na estratégia de marketing e jurídica de Nicolau ainda tem possibilidades jurídicas de ser represado. O TRE-AM deve decidir se cabe mesmo a Alfredo Nascimento o exercício da resposta por informação inverídica relacionada à prefeitura.
Esta questão será debatida no efeito suspensivo determinado pelo desembargador eleitoral e juiz federal Márcio Cavalcante, que suspendeu os 96 minutos de direitos de resposta nesta quarta-feira, dia 4. Se a decisão for contrária a Nicolau, a trava da metralhadora é retirada.
Déjà-vu
Algo semelhante ocorreu nas Eleições 2016, quando advogados da campanha de Arthur Neto fizeram uma farra na reta final da campanha de Marcelo Ramos. O dano foi irreparável.
Uma coincidência entre os dois episódios vale destaque, sobretudo quando tantas discussões ganham espaço tendo o machismo como pano de fundo na sociedade.
Tanto a campanha de Marcelo Ramos quanto a campanha de Ricardo Nicolau, na guerra de vaidades entre advogados, abriram mão de serem coordenadas por uma mulher: a advogada Maria Benigno, que é reconhecida pela experiência e competência na justiça eleitoral do Amazonas, setor dominado por homens.
No dia da convenção do PP, Nicolau e outros políticos chegaram ao local do evento com máscaras do hospital Samel. Na ocasião, Maria Benigno era a advogada da campanha e foi questionada por esta repórter se a conduta era regular. A advogada respondeu que não, que a direção da campanha havia sido informada e que aquele ponto seria alterado para evitar problemas. Dias depois, o que mudou foi o jurídico da campanha.